Crime sem castigo: a história de 3 famílias destruídas por mortes em ações policiais e a frustrante luta por punição: 'Racismo enraizado'

Frase é da mãe de Jonatha, que sofreu em três tempos: quando o filho levou um tiro nas costas, quando tentaram criminalizá-lo e quando a Justiça decidiu que ele não teve intenção. RJ2 conversou com familiares

Três famílias da Zona Norte do Rio viveram recentemente uma dor semelhante. Em meio ao luto após perderem parentes baleados durante ações policiais, eles enfrentaram desafios emocionais e batalhas em um sistema, muitas vezes lento e frustrante, no qual os autores dos disparos ficam sem punição.

O desespero da mãe de Jhonatha de Oliveira Lima, morto aos 19 anos com um tiro nas costas, em Manguinhos, virou notícia ao fim do julgamento do policial que efetuou o disparo.

“Essa é a resposta que a sociedade dá pra mim?”, foi a pergunta feita pela mãe de Jhonatha assim que soube da decisão que manteve a liberdade para o policial Alessandro Marcelino de Souza, ao entender que ele não teve a intenção de matar. O julgamento foi em 6 de março.

Ana Paula oliveira posa com a camisa do filho Jhonatha,
morto em 2014 pela polícia

“Foi um grito de desespero. O assassino do meu filho estava saindo dali mais uma vez, com total certeza da impunidade. Um desespero quando eu penso que ele pode sair daí e matar outras pessoas, com a certeza de que ele é amparado pela Justiça”, desabafa Ana Paula.

Alessandro Marcelino, que já tinha sido preso, em 2013, por um triplo homicídio em Queimados, passa a ser julgado pela Auditoria Militar. A espera da família de Jhonatha recomeça até que saia uma sentença.

“Eu senti como se tivessem, pela terceira vez, matado o meu filho. A primeira é quando matam o corpo. A segunda é quando tentam criminalizar essa vítima, é um segundo assassinato. E naquele dia 6 ali para mim, eu me senti como se tivessem mais uma vez matado o meu filho”, destaca a mãe.

"O que eu percebo é que a Justiça não consegue se enxergar em pessoas como eu, sabe? Pobre, população preta. Eu vejo um racismo enraizado dentro desse sistema de Justiça e infelizmente também na nossa sociedade", completa ela.

Cláudia: baleada e arrastada em carro da PM

Cláudia Ferreira foi arrastada depois de cair do porta-malas de uma viatura da PM

A família de Cláudia Ferreira também esperou 10 anos por uma sentença – que frustrou mais do que a espera.

A auxiliar de serviços gerais tinha 38 anos e ia comprar pão quando foi baleada no Morro da Congonha, em Madureira. Depois de atingida, foi jogada no porta-malas da viatura pelos policiais militares.

Cláudia da Silva Ferreira foi arrastada em carro da polícia militar do Rio de Janeiro

No trajeto para o hospital, o porta-malas abriu e o corpo de Cláudia foi arrastado por 350 metros pendurado por um pedaço da roupa.

O capitão Rodrigo Medeiros Boaventura era quem comandava a patrulha. Ele e o sargento Zaqueu de Jesus Pereira Bueno, ambos do 9º BPM (Rocha Miranda), respondiam por homicídio.

O juiz Alexandre Abrahão Dias Teixeira, da 3ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio, disse que “os acusados agiram em legítima defesa para repelir a injusta agressão provocada pelos criminosos, incorrendo em um erro na execução, atingindo Cláudia”.

Protesto pela morte de Cláudia Silva Ferreira

A família de Cláudia diz que não havia tiroteio na comunidade e o irmão acredita que ela já estava morta quando foi colocada no porta-malas, já que foi atingida por dois tiros de fuzil à queima roupa no peito.

“Não tinha mais esperança, porque o estado fez questão de mostrar que pra gente a justiça realmente não existe”, desabafa o irmão Júlio César Ferreira. “Uma justiça que a gente sabe que não vai ser feita.”

Outros seis PMs foram absolvidos do crime de fraude processual – por retirarem o corpo do local da morte.

Mãe morre sem ver culpados por balear o filho

Lucas Azevedo Albino, de 18 anos, foi morto em um dos acessos ao Complexo de favelas da Pedreira, em Costa Barros

A mãe de Lucas de Azevedo Albino foi uma "leoa" para defender a honra do filho, que tinha apenas 18 anos quando foi executado em Costa Barros. No dia 10 de março deste ano, a Justiça arquivou o caso e autorizou os PMs a voltar para as ruas.

A liberdade dos policiais amedrontou a família, que não se sentiu confortável para dar entrevista à TV Globo. Quem nunca se calou foi a mãe, Laura, morta no ano passado, vítima de um câncer.

O juiz Gustavo Kalil, da 4ª Vara Criminal, impronunciou os PMs Bruno Rego Pereira dos Santos, Luiz Henrique Ribeiro Silva, Sérgio Lopes Sobrinho e Wilson da Silva Ribeiro por falta de provas. Ou seja, não encaminhou para o júri popular.

O caso de Lucas só chegou até a mesa do juiz por insistência da mãe, que decidiu investigar por conta própria a morte. Foi assim que quatro policiais do 41º BPM (Irajá) viraram réus.

Lucas e a mãe iam para a praia em uma manhã de domingo. O jovem saiu com um amigo para buscar a namorada e acabou morto. Ele estava na garupa quando foi atingido no ombro. Uma foto mostrava que ele foi colocado na viatura ainda vivo.

Com relatos e fotos, Laura refez os últimos passos do filho e colheu provas para o processo. Além disso, convenceu uma testemunha a depor no Ministério Público.

Para incriminar, os policiais afirmaram que ele era traficante e estava com uma granada e drogas. Mas, a testemunha disse que, depois de baleado, ele gritava que era inocente e pedia pela mãe.

No caminho do hospital, ele foi atingido por um tiro na testa. O juiz alegou falta de provas técnicas e que não tinha como concluir que o policial teve a intenção de matar. A decisão afirma que os policiais agiram em legítima defesa e que o tiro que acertou a cabeça de Lucas veio de cima da comunidade, tendo sido disparado por traficantes.

Mesmo sendo autor da denúncia contra os policiais, o Ministério Público não se opôs à decisão do juiz. Já a Defensoria Pública foi contra e decidiu recorrer.

"Lucas foi executado no trajeto ao hospital, nós recorreremos da decisão em nome da memória de Lucas, que não era traficante, e da memória de Laura", afirma o defensor público Luís Zouein.

"O Lucas não vai ser mais um jovem de Costa Barros morto, eu não vou deixar por isso mesmo", disse Laura, na época do crime.

https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/rj2/video/dor-e-revolta-a-historia-de-tres-familias-marcadas-pela-violencia-policial-e-impunidade-no-rio-de-janeiro-12514757.ghtml

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